O eixo entre o Rossio e o Marquês de Pombal bem poderia ser considerado o West Finish (Londres) ou o 9º arrondissement (Paris) de Lisboa devido ao número de salas de espetáculos mais concentradas na Rua das Portas de Santo Antão, entre D Maria e Ateneu passando pelo Coliseu, Politeama e Casa do Alentejo. Esse é o cartão de visitas da cidade, que já agregou boas cervejarias à sua atividade artística. Fecharam para dar lugar a restaurantes que anunciam a cozinha artesanal e tradicional portuguesa, mas só na ementa.
A sardinha assada em qualquer altura do ano, que segundo o workers é fresca, levanta desde emblem a suspeita. Há também bacalhau e polvo à lagareiro, carne de porco à alentejana, arroz de polvo, marisco e tamboril, bacalhau à Brás, todos os pratos da cozinha nacional. Os restaurantes que o servem têm toldos com os rótulos “tradicional” e “artesanal português”, quatro no complete só nesta artéria. Estendem-se pela Rua Jardim do Regedor, até aos Correiros e Sapateiros.
O menu, design e inscrições são os mesmos, mas o nome do restaurante não é visível. DN queria saber o que estava por trás dessa transformação. Entramos e não gostamos, a começar pelo atendimento. Os funcionários não sabem o que oferecem aos clientes, principalmente turistas. Os pratos não são muito tradicionais e são servidos em pequenas porções. Os preços dos pratos do dia não são altos, pois o restante do cardápio é mais caro. Extras como vinho e sobremesa custam € 4,90 por porção. E há quem nas redes sociais se queixe de ser cobrada uma taxa de serviço de 15 a 20%, que justificam como exigência da Câmara de Lisboa. Não fomos cobrados por essa taxa, nem por mini creme brulee instantâneo sem açúcar queimado. Protestamos em português.
Os nepaleses apostam nos portugueses
Quem está por trás deste negócio e qual é a sua estratégia?
Este é Dhurba Subedi, um nepalês de 37 anos que chegou a Portugal em 2007 (tem cidadania portuguesa), aqui nasceram a filha de 7 anos e o filho de 2 anos. Ele fica visivelmente triste quando criticamos o que ele serve, ele nega cobranças extras, ele se protege das dificuldades de contratação. “Estava focado em fazer boa comida portuguesa, formamos as pessoas durante três a quatro meses e elas vão-se embora. E na Baixa nem se pode fazer comida mais tradicional porque os turistas não gostam.”
A Dhurba já contava com 50 restaurantes, principalmente em Lisboa, mas também em Viseu, Funchal, Ponta Delgada, Barreiro, Seixal e Montijo (além de Espanha, Alemanha e Bélgica). Ele garante que o objetivo sempre foi divulgar a gastronomia portuguesa, que não tem dado certo no exterior. “As pessoas naturais não vão a um restaurante português, nem os portugueses.” Escolheu a ementa portuguesa depois de sete anos a trabalhar em casas da Baixa. Estas não foram as primeiras obras.
Durba Subedi emigrou do Nepal (Pokhara) para a Bélgica aos 18 anos, morou em Barcelona e trabalhou na loja do FC Barcelona. Aprendeu línguas e juntou dinheiro para se dedicar à restauração em Portugal, onde chegou com 21 anos. “Aluguei dois restaurantes e abri com comida indiana. Algo deu errado, o dinheiro que ganhava na Bélgica sumiu, tive que procurar emprego. nepalês, falo espanhol, francês, alemão, holandês, italiano, russo e japonês.”
Ele conheceu Baisha, os funcionários e os donos do restaurante. “A maioria eram idosos que me pediram para manter o restaurante. Ofereci um aluguel mensal (5 ou 10 anos) e fiquei. Aproveitei a fase do coronavírus, as pessoas estavam com problemas e não precisei investir muito dinheiro. Comi sushi, comi takeaway”, diz.
Ele garante que não compra nem paga repasses, mas há momentos em que é dono de ações e tem sócios.
O restaurante Derby, nas Portas de Santo Antão, foi o primeiro. Adquiriu 25% em 2014, atualmente possui 100%. Antigamente period uma lanchonete, mas abriu como um restaurante tradicional português. Há uma pequena cozinha onde trabalham os nepaleses. Eles começaram a trabalhar à noite e todos os dias da semana. No entanto, ele não vai pagar as contas, o que parece ser a estratégia de Dhurba. “Não temos perdas, não temos grandes lucros, é quase uma troca por uma troca”, explica sobre o seu negócio. E quando não está, fecha ou muda o menu. O Derby se tornará um espaço vegano.
Na mesma rua fica a velha Andorra, Lagosta Actual, Prazeres do Mar e, ao lado, Sol Dourado. Não são só restaurantes com mesas vazias – tem a Marisqueira Uma, que serve só arroz com frutos do mar, e tem fila. Cerca de 20 pessoas em Portugal e no estrangeiro e 120 colaboradores, maioritariamente nepaleses.
Durba percebe que a comida portuguesa não é muito boa, pelo menos não da forma como a oferece. Começou no ramen, uma sopa japonesa, com dois restaurantes em Lisboa e um no Barreiro: o Ramen Bambu. “Estou focado em construir uma boa marca e apenas trabalhar nisso. O que eu não posso fazer, eu desisto.”
Filosofia empresarial alterada
Todas essas transformações são “tristemente” observadas por Alípio Ramos, de 76 anos. Trabalha na Frutaria Bristol, fundada em 1929. “Descobri esta rua quando ainda passava o eléctrico. Ela tinha um dos melhores restaurantes de Lisboa. [mantêm-se dois de elite], espaços fechados e surgidos que nada têm a ver com Portugal. A pandemia deu um golpe mortal. Não só os restaurantes estão mudando, eles estão transformando tudo em hotéis. Sobrevivemos com turistas e alguns portugueses.”
O Restaurante Inhaca é um dos poucos restaurantes nas Portas de Santo Antão que possui uma cervejaria tradicional. O proprietário Armando Batista administra o espaço há 46 anos (ele tem 74 anos). “Nossa base é o peixe fresco e frutos do mar, como a carne. Eu olho para as janelas dos outros e não vejo nada disso, não sei como eles vivem. Os negócios mudaram.”
Com sete funcionários, alguns com quase 30 anos, não se sabe por quanto tempo manterá as portas abertas. “Frutos do mar são vendidos pouco. E falta pessoal capacitado”, reclama. Ele afirma que ter restaurantes abaixo do padrão perto dele o prejudica. “Essa é uma rua por onde passam muitas pessoas, se você for no primeiro restaurante e for enganado, não volta mais. Os clientes que nos conhecem valem a pena.” Espere deixar o restaurante para um dos funcionários. Ele deposita suas esperanças em Diogo Marquez, 33, que começou a trabalhar lá aos 17.
A Associação de Dinamização da Baixa Pombalina acompanha com preocupação todas estas transformações: “O comércio na Baixa perdeu qualidade. Embora tenham surgido várias ofertas inovadoras, muitas delas são do agrado de quem nos visita. O empresário sempre age com a intenção de lucrar, buscando o que mais vende e sempre muda. Não basta comida de qualidade com comida tradicional portuguesa.”, critica seu presidente Manuel Lopez. Ele enfatiza: “Não é como antigamente quando as pessoas abriam um restaurante para deixar para os filhos. Agora ele abre e mantém enquanto funciona ou está na moda. No dia que não acontecer, fecha. Mas estou convencido de que existem clientes aos quais a qualidade pode ser oferecida.”
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