Brasil corre risco de insolvência se financiar empresas argentinas

Em visita à Argentina no início desta semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) falou sobre a importância do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no financiamento de obras em países parceiros. Uma prática que já foi alvo de críticas em gestões anteriores do PT voltou ao centro das discussões nesta semana. Os especialistas ouvidos pelo DIÁRIO DO COMÉRCIO avaliam a proposta com cautela. Para eles, a situação atual do país vizinho e o histórico de insolvência nas negociações com ele e outros alertam para um possível acordo.

A intenção do governo federal é apoiar o desenvolvimento da infraestrutura nos países da América do Sul e da América Latina. Lula em seus discursos solo hermano mencionou a disponibilidade do BNDES para ajudar na obra. Entre as usinas, destaca-se a ampliação do gasoduto Vaca Muerta, cuja construção transportaria gás da Argentina para outros países.

Enquanto em seu discurso o petista enfatizou a importância do papel do banco público no financiamento de futuros investimentos internacionais, os casos de insolvência já observados por algumas nações foram criticados pelos opositores.

Para coordenador do MBA em gestão estratégica e econômica de negócios da Fundação Getulio Vargas (FGV), Mauro Rochlin, entender se o uso de recursos do BNDES para financiar projetos em outros países será ou não benéfico para o Brasil é uma tarefa difícil, pois ainda não há muitos detalhes.

“Pode ser algo benéfico para o país, mas dependendo do projeto que você vai adotar. A questão de analisar o que seria exatamente esse projeto, em que condições ele poderia ser implantado e que retorno traria para o Brasil são questões que precisam ser avaliadas.”

Professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Academia de Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Mauro Sajar destaca que na união monetária entre Brasil e Argentina, e em qualquer parceria entre os dois países, o financiamento seria positivo se fossem reunidas algumas condições para o funcionamento dessa união. “O jeito mais simples é pensar em uma nova moeda quando, por exemplo, cada estado do Brasil tinha uma moeda diferente”, diz.

Nessa hipótese, o especialista da UFMG afirma que com a semelhança dos ciclos econômicos no Brasil, a inflação sobe em todas as regiões, e o desemprego sobe e desce em todas.

“Dessa forma, se uníssemos a moeda, nessa hipótese, cada estado teria lucro para si e para o país, porque seria um todo. Portanto, reduziria os custos de transação, pois você não precisaria trocar moedas constantemente. No caso de importadores e exportadores, eles não pensariam no risco de perder ou ganhar mais, ou mesmo na necessidade de realizar operações para evitar o risco cambial”, analisa Sayar, destacando que “entre Brasil e Argentina, no entanto, a mesma situação.”

Historicamente, os dois países têm condições macroeconômicas muito diferentes. Por exemplo, no país de Hermano, analistas do mercado argentino acompanham a inflação, que se aproxima de 100%. No Brasil, a inflação oficial, embora elevada, está entre 5% e 6%, segundo cálculos recentes do The Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

E dada a possibilidade de política monetária para esses dois países com apenas um banco central, qual inflação ele tentaria suprimir? Inflação na Argentina ou inflação no Brasil? Sayar acredita que esta seria uma situação completamente inviável do ponto de vista da eficiência, não do ponto de vista político.

“Os governos poderiam até implementar, mas não haveria benefício. Seria uma grande confusão. A inflação no Brasil provavelmente seria maior se a situação fosse muito mais desagradável e incerta”, aponta o professor da UFMG.

Nesse contexto, a principal questão é se a situação atual do BNDES permitirá que o banco atenda às necessidades de investimentos. Mauro Rochlin, da Fundação Getulio Vargas, diz que depende, mas o quantity de recursos caiu drasticamente nos últimos anos. “Vamos ver se algumas propostas de investimento podem surgir dessas conversas entre o presidente e outros países. Muito, porém, dependeria do tipo de projeto a ser implantado e dos investimentos realizados no exterior. Então seria bom comparar os projetos para ver se o BNDES pode viabilizar ou não.”

“A credibilidade do BNDES foi significativamente reduzida sob o ex-presidente Michel Temer, bem como sob o ex-presidente Jair Bolsonaro. Essas reduções resultaram de pagamentos feitos pelo BNDES ao governo federal. Então, hoje, a capacidade do BNDES de financiar empréstimos e novos projetos é muito menor do que no passado”, diz Rochlin.

Segundo o especialista, a ideia de Lula é um “balão de ensaio”.

Levando em conta o contexto de aproximação entre os dois países, Mauro Sayar destaca que a medida de investimentos apresentada por Lula não é favorável. “Não vejo absolutamente nada de benéfico numa possível união monetária como foi proposto nos últimos dias. Eu realmente não acho que isso vai acontecer porque considero isso um balão de ensaio.”

Segundo ele, do ponto de vista operacional, a proposta reflete a ideia de ampliar mais o financiamento do comércio exterior, mas não se sabe se haverá recursos suficientes para implementá-la. “Uma solução seria criar uma caixa de conversão de importações e exportações entre Brasil e Argentina” para evitar, segundo o economista, tanta oscilação do dólar como ocorre hoje. “No entanto, importadores e exportadores precificariam seus produtos em moeda americana porque não faz sentido tentar precificar e receber em outra moeda que não seja o dólar, por exemplo”, acrescenta.

Quem arcaria com o risco de crédito?

Atualmente, uma das principais dificuldades do país argentino é o problema da incapacidade de common suas atividades. Mas qual banco brasileiro estaria interessado ou disposto a financiar essas empresas exportadoras nas condições que o governo brasileiro quer anunciar em breve?

Mauro Sayar estima que é muito provável que algumas empresas argentinas enfrentem a insolvência. “Esse pode ser o caso em vista do histórico comercial recente da Argentina, não só com o Brasil, mas com outros países. Portanto, haveria uma perda. Os contribuintes brasileiros, por exemplo, sofreriam se fossem assumidas pelo Tesouro? Fernando Haddad já afirmou que o risco não ficará com o Banco do Brasil. Mesmo que exista um fundo de exportação, o custo de oportunidade desse fundo precisa ser explorado para a realização das operações. Caso contrário, do ponto de vista macroeconômico, não acho bom para o Brasil”, conclui.

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