Uma harmonização simples: pão integral, tomate frito, berinjela enlatada, algumas folhas, um pouco de farinha de castanha e um pouco de azeite por cima. Acompanhado por um copo de vinho tinto. Assim, sem muito requinte, cria-se um cardápio de pratos saudáveis, saborosos e atraentes, que acaba de ser eleito o melhor alimento dietético do mundo pela sexta vez consecutiva. Esta é a dieta mediterrânea, eleita por um painel de especialistas compilado pelo US Information & World Report – o conglomerado de mídia americano que compila esse tipo de classificação há mais de trinta anos – como a dieta mais adequada para manter um corpo saudável. Afinal, seus benefícios não se limitam à perda de peso, efeito tradicionalmente esperado das dietas. Promove a perda de peso, embora não seja tão eficaz quanto o regime número um dos Vigilantes do Peso nesta categoria, mas sua cobertura vai além disso. O Mediterrâneo foi mais uma vez coroado campeão porque também reduz a probabilidade de doenças graves, como doenças cardiovasculares e câncer. Além disso, é aliada do pensamento aguçado e da memória e desempenha importante papel no equilíbrio da microbiota intestinal, conjunto de microrganismos que habitam o trato digestivo, responsáveis por funções cruciais – desde combater a inflamação até participar do controle do sangue níveis de açúcar.
Durante décadas, a ciência estudou os alimentos consumidos pelos povos da região do Mediterrâneo para descobrir o que os torna tão saudáveis. A atenção foi atraída na década de 1950, quando o cientista americano Ansel Keyes, da Universidade de Minnesota, apontou pela primeira vez a ligação entre esse estilo de alimentação e a saúde cardiovascular. Ele ficou intrigado com a descoberta de que os frugais italianos do sul tinham corações mais fortes do que os ricos nova-iorquinos, que tinham muito mais acesso aos cuidados de saúde. Keys suspeitava que o motivo dessa diferença residia na dieta dos italianos, rica em peixes frescos, azeitonas, grãos integrais e farta em vegetais, legumes e oleaginosas, como feijão e lentilha. A curiosidade científica o levou a realizar o estudo seminal, o Seven Nations Examine (Estudo dos Sete Países). Ela avaliou a alimentação e o estilo de vida na Finlândia, Holanda, Itália, Estados Unidos, Grécia, Japão e Iugoslávia (país dos Bálcãs que existiu de 1918 até a década de 1990, quando entrou em colapso e gerou várias nações). Como resultado, ficou claro que os produtos consumidos na Itália, Grécia e Iugoslávia diferiam na atividade cardíaca e cerebral dos habitantes desses países. Desde então, todos os ingredientes do cardápio mediterrâneo passaram por uma análise detalhada para identificar as substâncias que são tão boas (leia no quadro).
Uma refeição mediterrânea típica deve consistir em pão ou macarrão feito com grãos integrais, vegetais, folhas, castanhas, nozes e azeite. Este iniciante de resistência, vamos chamá-lo assim, é rico em proteínas, vitaminas, ferro e outros nutrientes com efeito positivo comprovado contra doenças cardiovasculares, diabetes e câncer. Sem falar na concentração de fibra necessária para a digestão e valiosa para aumentar a saciedade. Em quantidades menores, o cardápio recomenda comer queijo ou iogurte e peixes como salmão, sardinha e atum. Fontes de proteína animal da melhor qualidade, ajudam a proteger o sistema cardiovascular em grande parte devido à ação do ômega-3, nutriente creditado com propriedades anti-inflamatórias e encontrado em boa concentração. Recomenda-se saboreá-los pelo menos duas vezes por semana. Só depois disso é mostrado o consumo de frango, ovos, doces e carne vermelha. Cada refeição pode ser acompanhada por um copo de vinho. No entanto, existem duas regras que não podem ser desconsideradas se o objetivo for aproveitar tudo o que a dieta tem a oferecer. Primeiro, não use nada processado ou processado industrialmente. Segundo: o exercício físico é necessário para que os resultados sejam ainda mais perceptíveis (leia a coluna de Lucilia Diniz). Por analogia gastronômica, o exercício harmoniza com os pratos, assim como o vinho realça o sabor do peixe.

A disponibilidade de ingredientes e a praticidade de cozinhar facilitam a alimentação do brasileiro. O que não ajuda muito são os preços. Atualmente, os óleos mais básicos custam pelo menos 20 reais. Um quilo de salmão passa de 100 reais. Alimentos orgânicos e integrais às vezes custam até três vezes o preço de um produto padrão. Existe uma maneira de contornar esse obstáculo? Sim. “No closing de semana, a cerveja pode ser trocada por suco de uva integral, castanha por amendoim e atum por sardinha”, diz a nutricionista Anna Carolina Di Creddo Alves, do Instituto do Coração, em São Paulo. Assim, adaptando-se aqui e ali, a vitalidade e a saúde do ensolarado Mediterrâneo podem chegar à mesa do brasileiro.
Publicado em VEJA 18 de janeiro de 2023 Edição nº 2824.